A forte queda de juro no Brasil

André Galhardo - De Olho no Câmbio

Visão Geral

O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu, por unanimidade, reduzir a taxa básica de juros de 3% para 2,25% ao ano.

Na nota disponibilizada logo após a reunião do colegiado, ficou claro ainda que, a depender dos desdobramentos econômicos decorrentes da pandemia, a autoridade monetária poderia realizar um novo ajuste, no entanto, diferentemente dos cortes sucessivos cortes de 0,75%, esse último seria meramente residual.

O corte da taxa de juro indica que há um esforço muito grande do Banco Central em tentar reanimar a economia cujas primeiros sinais pós pandemia são de quase paralisação.

Neste caso, os sucessivos recordes de taxa básica de juro nominal mais baixa da história brasileira são acompanhados do temor do desmantelamento econômico nacional.

Quais serão os próximos passos?

Com o que devemos nos preocupar?

 Acompanhe nossa análise a seguir.

Mais um corte residual, o que isso significa?

O Banco Central deixou claro na nota emitida logo após o término da última reunião do Copom que, dependendo dos impactos da propagação da covid-19 no Brasil, o colegiado poderia realizar um novo corte, residual, a fim de enfrentar os sinais claros de paralisação da atividade econômica brasileira.

A nota não deixou claro o que seria este eventual novo corte residual, no entanto, acreditamos que o comitê tenha sinalizado um novo corte de 0,25%, reforçando, se necessário.

Ocorre que, essa parte da nota em que o Copom diz esperar novos dados para a tomada de decisão, nos faz acreditar que um novo corte pode ir além de um ajuste fino, ou seja, acreditamos que os efeitos da pandemia no Brasil serão ainda mais duros e que isso pode obrigar o Banco Central a realizar um corte mais ousado, na casa dos 0,5%, por exemplo.

Por que reduzir tanto a Selic?

O título deste texto não tem a intenção de ser pessimista apenas. Nós só estamos alertando sobre o funcionamento econômico.

O governo tem a possibilidade de agir de diversas formas diantes de um ambiente de crise. Isso é o que chamamos de política econômica.

Essas políticas econômicas são divididas em: política fiscal, política monetária, política industrial, política cambial e política de rendas. Todas elas constituem o poder de ação do estado sobre a economia nacional.

As ferramentas da política monetária envolvem, entre outras coisas a taxa de juros. O mecanismo é simples. Quanto menor a taxa básica de juros maior tende a ser a atividade econômica.

Bem, se os rendimentos de títulos financeiros estão menores, o mercado procurará investimentos em ativos fixos, ou seja, já que o investidor não está conseguindo um rendimento interessante na compra de títulos públicos, o mesmo optará por realizar investimentos em fábricas, equipamentos e outros ativos reais cuja demanda por emprego é muito maior que aquela gerada pela compra de títulos públicos,

Mais ativos reais, mais empregos, mais consumo, mais produção, mais investimento. Esse é o ciclo que a política monetária expansionista (redução de taxa de juros, por exemplo) pretende ativar.

Então a queda na Selic é boa para o Brasil?

Aqui mora o problema!

Eu não vou me alongar muito em algumas questões porque já usamos este espaço algumas vezes para questionar a potência da política monetária sobre a atividade econômica. Culpamos a concentração bancária e os spreads decorrentes desse problema, então, tentarei ser sucinto.

O primeiro problema deriva justamente disso. Uma taxa básica de juros no Brasil não significa menor custo de captação de crédito ao empresário ou consumidor, ou seja, o esforço que o Copom vem fazendo para criar aquele ciclo virtuoso na economia, se perde no meio do caminho.

De maneira muito simplista é o mesmo que dizer que a diminuição dos custo do dinheiro não é repassada ao consumidor final.

A primeira coisa que decorre da queda da taxa básica de juros então, é uma fuga do capital financeiro dos títulos públicos para a bolsa de valores. 

De modo geral, os ganhos obtidos (em potencial) no mercado de ações serão maiores que aqueles (em potencial) esperados nos investimento em ativos fixos.

Essa não é uma exclusividade do Brasil. No mundo inteiro o capital especulativo abandona a renda fixa para a renda variável e vice versa, sempre que os rendimentos de um ou de outro se mostra mais atrativo, no entanto, esse processo tende a ser mais agudo no Brasil a partir de agora.

Mais uma jabuticaba brasileira?

Por meio da medida provisória 936/2020 o governo permitiu a empresas que reduzissem  ou suspendessem a jornada de trabalho durante o período de calamidade pública. Segundo membros do governo a referida MP é fundamental para evitar o desligamento dos funcionários, o que ajudaria a aprofundar a crise. 

Acontece que, nesse momento, de redução da massa salarial – diminuição do montante de salário disponível dentro de uma economia – ajuda a impedir ainda mais a já comprometida política monetária.

Veja você! Com a redução do poder de compra das pessoas, como empresários em potencial poderiam ter predileção por investimentos em ativos fixos?

O empresário investe esperando ganhar no futuro, no entanto, a crise gerada pelo novo coronavírus associado às tentativas do governo de contornar a crise de modo a reduzir a massa salarial, acaba por suplantar qualquer intento dos empresários de sair da renda fixa para investimentos produtivos.

Aqui não estamos apenas criticando o mérito da MP 936, até porque para isso deveríamos propor alguma alternativa, que poderia ser tratada em outro oportunidade neste espaço, mas estamos reafirmando que a crise, somada a diminuição do poder de compra do consumidor brasileiro tendem a transformar a Selic em um instrumento meramente decorativo.

E o câmbio, afinal?

Apesar dos pesares, o Copom acerta em reduzir a  taxa básica de juros da forma como vem fazendo.

O temor do mercado de que a redução da taxa traria uma imensa fuga de capital estrangeiro do mercado brasileiro não se confirma.

O investidor estrangeiro entende que a ação do Banco Central condiz ao menos com a tentativa de fazer o Brasil sair mais rápido da crise. Ainda que as particularidades do mercado brasileiro impeçam que as ferramentas atuem de forma mais potente.

Portanto, apesar da redução da Selic representar uma diminuição dos rendimentos dos títulos públicos, esse mecanismo não deve representar maiores problemas para o câmbio BRL/USD, porque há uma redução sensível das taxas de juros no mundo inteiro.

O que tem pressionado o valor da moeda americana sobre a brasileira é a instabilidade política, tal como foi no começo deste ano e durante boa parte de 2019.

Veremos.

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