Carga tributária no Brasil e o impacto no câmbio

André Galhardo - De Olho no Câmbio

Visão Geral

Em plena semana na qual os membros dos poderes executivo e legislativo voltaram a conversar sobre a reforma tributária, o tema se tornou central no debate público brasileiro ao lado da Covid-19. 

O simples fato do governo se movimentar em direção aos objetivos maiores que são as reformas, trouxe algum alento ao mercado financeiro e de câmbio nos últimos dias. Em particular, frente a relativa imobilidade dos poderes que, por razões óbvias, direcionaram as energias para o enfrentamento da pandemia.

A reforma entregue pelo poder executivo é propositiva? As propostas de emenda à Constituição Federal feitas pelo Congresso Nacional serão afetadas? O que esperar de tais reformas e como isso pode afetar o mercado de câmbio?

Acompanhe nossa análise a seguir.

O que dizem as propostas do poder legislativo

Existem duas propostas tramitando no Congresso Nacional. A primeira, na Câmara dos Deputados, é a PEC nº 45/2019. A segunda, no Senado Federal, é a PEC nº 110/2019.

A primeira visa extinguir cinco impostos e criar apenas um tributo chamado Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS). Este novo imposto seria de competência federal. A segunda, mais complexa, propõe a extinção de ao menos nove tributos para a criação de um único imposto nos mesmos moldes previstos na primeira proposta. A competência do imposto criado pela PEC nº 110 seria estadual.

O primeiro impasse vem justamente da diferença entre as PECs sobre o número de tributos aglutinados em um único imposto. Quanto mais impostos, maior a simplificação do regime tributário. Sob este ponto de vista, seria excelente, mas também implica em uma alíquota maior para o novo imposto.

Estimativas iniciais apontam uma alíquota única de 25% no IBS da proposta vinda da Câmara do Deputados. A proposta do Senado, que conta com mais quatro tributos, teria uma alíquota acima disso. Desse modo, abre-se mais uma discussão: vem mais imposto por aí?

O que o Governo Federal pretende fazer

O Ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou a proposta do poder Executivo ao Congresso Nacional e nela constavam a “aglutinação” de menos impostos para a criação de um imposto sobre valor adicionado.

A proposta do governo sugere a união apenas do PIS e da Cofins, resultando na criação do novo tributo, chamado Contribuição de Bens e Serviços (CBS), cuja alíquota seria de 12%. 

O governo ainda estuda a criação de um novo imposto que incidiria sobre operações digitais. O ministro da economia tem falado em uma alíquota entre 0,2% e 0,4%. A comparação com a extinta CPMF é inevitável. A alíquota da CPMF era de 0,38%.

O governo garantiu que esse novo tributo teria a duração de dois anos apenas, no entanto, não é demais lembrar que a CPMF é o acrônimo para Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras.

A carga tributária brasileira é elevada?

Para responder a essa pergunta é preciso saber com o que estamos comparando, afinal, algo só é grande ou  pequeno, alto ou baixo quando comparado com alguma outra coisa. Assim, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a carga tributária brasileira fechou o ano de 2018 em 33,1% do PIB.

Quando comparamos, portanto, a carga tributária brasileira com o percentual médio das economias que compõem a OCDE, percebemos que a nossa carga tributária é mais baixa. Em 2018 a média estava em 34,3%.

A carga tributária brasileira está muito abaixo das cargas da França e da Bélgica, por exemplo, que são de 46,1% e 44,8%, respectivamente. Comparar o Brasil com a França não parece a coisa mais sensata a se fazer, então vamos olhar para os nossos vizinhos.

Ainda segundo a OCDE, a média da carga tributária sobre o PIB para a região da América latina foi de 23,1% e, de fato, nestes termos, o Brasil fica muito acima dos seus pares, perdendo apenas para Cuba, cuja carga tributária sobre o PIB ultrapassa os 42%.

Então, a nossa carga tributária é menor que a da maioria dos países desenvolvidos, no entanto, quando comparamos com as economias americanas nós ficamos bem acima neste quesito. Mas não é aqui que mora o problema.

Complexidade e regressividade

O intento das reformas que estão postas no Congresso, cabe lembrar, é de diminuir a complexidade dos tributos brasileiros. Isso se dá por conta do entendimento de que o regime tributário brasileiro é complexo. Esse é um entendimento geral, que vai desde o pequeno empreendedor até especialistas no assunto. 

Isso posto, é fundamental que aproveite esta oportunidade de reforma para diminuir o máximo possível esta complexidade.

Outro problema do regime tributário brasileiro decorre do seu caráter regressivo. Um regime tributário é considerado regressivo quando está assentado em impostos indiretos, sobre consumo. 

Neste tipo de imposto, não há distinção do contribuinte e, portanto, não cumpre, nem de longe, o princípio da capacidade contributiva. Impostos indiretos acabam penalizando relativamente mais aqueles que têm menor renda.

Além do problema social de impostos como o ICMS e o ISS, estes tributos são mais sensíveis às crises econômicas.

Impostos indiretos acabam sendo mais afetados por crises como essa que estamos atravessando, uma vez que acompanham a atividade econômica Ao menor sinal de desaceleração, pavimenta-se o caminho rumo aos problemas nas contas públicas.

Uma reforma tributária nos moldes que o Brasil e os brasileiros precisam teria justiça social, criaria um ambiente de indução da atividade econômica e suavizaria os problemas fiscais em tempos de crise.

E o impacto sobre o câmbio, afinal?

No início dos anos 2010, o Brasil se firmou como um importante recebedor de investimentos estrangeiros produtivos .No entanto, o contexto entre 2010 e 2012 era completamente diferente.

Em 2008, uma crise varria as possibilidades de ganhos nas economias desenvolvidas, mas os anos subsequentes mostrariam crescimentos robustos de economia emergentes, como as que compõem  o grupo que passou a ser chamado de BRICS. Naquele momento era certa a chegada de dólares por aqui.

Desde então, com a retomada da economia estadunidense, a despeito do crescimento bastante marginal dos primeiros trimestres pós-crise do subprime, o capital estrangeiro tem apresentado predileção por países cuja estrutura político-institucional esteja menos abalada que a brasileira e com condições melhores de reprodução do capital.

A reforma tributária não será a solução de todos os nossos problemas, no entanto, fazê-la como tem que ser feita, ou seja, diminuindo a complexidade e a regressividade do regime, nos habilitaria a alcançar os antigos patamares de recebimento de recursos estrangeiros e, consequentemente, conviver com uma taxa de câmbio em patamares mais baixos do que os que temos visto no biênio 2019-2020.

Assim sendo, uma reforma tributária que reduza a complexidade e a regressividade pode tornar a economia brasileira mais atrativa novamente e fortalecer o Real no longo prazo. 

Veremos.

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