O aumento dos preços das commodities

Os últimos meses foram marcados por intensas movimentações econômicas, sobretudo no que diz respeito aos índices de preços e às remunerações dos títulos públicos de maior maturação.

Ambos movimentos estão ao menos indiretamente ligados ao encarecimento das commodities no mercado internacional. De um lado, a inflação vista em países como o Brasil, pode ser, em parte, atribuída ao aumento de preços dos produtos básicos, e de outro, a percepção de que esse aumento de preços pode ser prolongado e deve, por consequência disso, impactar também os preços ao consumidor têm pressionado o rendimentos dos títulos públicos em diversos países.

Esse novo ciclo de aumento de preços das commodities poderá, de fato, impactar a política monetária norte-americana, mesmo depois de tantos indícios sobre a relativa transigência do Federal Reserve para com a inflação? Essa eventual mudança de postura dos membros da autoridade monetária americana traria que tipo de consequência ao Brasil e ao restante dos países em desenvolvimento?

Acompanhe nossa análise a seguir.

O aumento dos preços das commodities

Segundo dados do Banco Central, o IC Br, índice que mede a variação dos preços das principais commodities globais, avançou cerca de 5,32% na passagem de fevereiro para março deste ano.

A despeito do importante aumento mensal, os percentuais são ainda mais agudos em outros tipos de comparação. O índice composto, que avalia o comportamento dos preços de commodities agrícolas, minerais e de energia, apresentou variação positiva de 66% nos últimos 12 meses. Nos três primeiros meses deste ano a variação foi de cerca de 25%.

O índice composto, tem sido pressionado pelas três categorias de commodities que compõem o indicador. As commodities agropecuárias, onde constam produtos como carne bovina, algodão, óleo de soja, trigo, açúcar etc, variou positivamente em 55,4% nos últimos doze meses. As commodities do grupo chamado metal, onde constam itens como o minério de ferro, ouro e prata, por exemplo, variaram positivamente em cerca de 80% nos últimos dozes meses, e, por fim, o grupo de energia, onde estão contidos o petróleo, o gás natural e o carvão, avançou cerca de 92,5% nos mesmos termos.

Conhecida a leitura de março, é possível observar que os três grupos ainda apresentam tendência de alta para os próximos meses, o que deve ser um alerta para a autoridade monetária brasileira. 

Como o IPCA, índice oficial de inflação brasileira, está acima do teto da meta pela primeira vez desde 2016 e a tendência é que continue subindo ao menos até o meio deste ano, a tendência de aumento dos preços das commodities podem sustentar um período mais prolongado de aumento da inflação no país.

E quanto a isso, apesar da vigilância do Banco Central, pouco poderá ser feito para conter um movimento inflacionário que é majoritariamente explicado por desequilíbrios de oferta e variação cambial.

As exportações e a inflação brasileira

A percepção de que a política monetária produziria poucos efeitos sobre o aumento da inflação visto nos últimos meses, advém do diagnóstico do problema. Para além da questão cambial, que já foi amplamente discutida neste espaço, chamo a atenção para o volume de exportações e o encarecimento das importações.

Do ponto de vista das exportações, de janeiro a março deste ano o Brasil já exportou cerca de US$ 55,7 bilhões, esse valor é 15,7% maior que o registrado no mesmo período do ano passado.

Entre os produtos com maior variação em relação ao ano passado estão: o minério de ferro, que é o principal item da pauta exportadora brasileira, cuja variação foi de +102,3%, e alguns alimentos essenciais também apresentaram volumosa variação de exportações em relação ao ano passado. As exportações de milho avançaram 38%, as de trigo +117,4% e as de carne suína +23%, por exemplo.

Quanto menor for o valor da moeda brasileira em relação ao dólar americano, mais barato os produtos brasileiros serão aos portadores de divisas estrangeiras, e quanto maiores forem os volumes de exportação, menor tende a ser a oferta para abastecimento do mercado doméstico. Mecanismo que influencia diretamente no índice de preços.

As importações e os repasses de custos aos consumidores

Enquanto as exportações crescem de forma significativa, as importações têm um comportamento muito mais tímido. A alta do dólar tende a diminuir o volume de importação, pelo encarecimento relativo dos produtos e insumos importados. 

De janeiro a março deste ano foi registrado aumento de 5,4% no total importado em relação ao mesmo período do ano passado, e o que poderia ser sinal de alguma retomada da economia nacional, reflete apenas, na verdade, o fraco desempenho das importações nos últimos anos. No primeiro trimestre de 2021 o Brasil importou US$ 47,7 bilhões, número inferior ao registrado no primeiro trimestre dos cinco primeiros anos da década passada (2011 – 2015).

A despeito da ausência de tração da economia nacional, um volume importante de insumos, matérias-primas e produtos acabados acabam tendo que ser importados. Com o dólar em níveis muito mais elevados que os registrados ao final do primeiro trimestre do ano passado, há um relevante encarecimento destes bens aos compradores nacionais. Esse aumento do custo tem sido repassado ao consumidor final, o que há alguns meses tem sido sistematicamente registrado pelos indicadores de inflação.

Quanto tempo o ciclo de aumento dos preços das commodities deve durar?

Parte da explicação para o aumento dos preços das commodities vem da retomada da economia chinesa e da relativa normalização das atividades nos Estados Unidos, Reino Unido e outras economias europeias.

Os dados da balança comercial chinesa apontaram para uma forte retomada da atividade na economia sínica. Em doze meses as exportações avançaram cerca de 30,6% enquanto as importações expandiram-se em pouco mais de 38%.

Nos Estados Unidos, as importações aumentaram 6,4% no primeiro bimestre deste ano em relação ao registrado em igual período do ano passado e cerca de 1,8% na comparação com o último bimestre de 2020 na série com ajuste sazonal.

E, para além dos dados do comércio exterior, temos os volumosos pacotes fiscais de estímulo à economia americana. Se aprovado o último pacote apresentado pelo governo Joe Biden, os Estados Unidos terão gasto 40% mais que a totalidade do PIB latino americano, em estímulos fiscais.

Pelos indicadores de retomada da economia europeia, pelos números do comércio exterior americano e chinês, pelos pacotes de estímulos fiscais vindos de toda parte, principalmente dos Estados Unidos e pelos indicadores antecedentes de outras economias, é provável que o ciclo de aumento dos preços das commodities seja mais longo do que se espera neste momento.

Impactos no câmbio

Você viu aqui, no texto da semana passada, que a política monetária brasileira e de demais países em desenvolvimento estão sujeitas às mudanças empreendidas pelos bancos centrais dos Estados Unidos, Europeu (BCE) e Japão.

Se o ciclo de aumento dos preços das commodities for, de fato, mais longo do que se imagina agora, pode haver uma antecipação da “normalização” das políticas monetárias nos Estados Unidos e na Zona do Euro, por exemplo.

Um aumento na taxa de juros por lá, poderia comprometer ainda mais o fluxo de recursos estrangeiros que em outro momento viria para o Brasil. Além disso, um ajuste de elevação nas taxas básicas do Federal Reserve e do Banco Central Europeu exerceriam pressões sobre a moeda brasileira.

Agora junte tudo isso.

A normalização das taxas de juros americanas atuariam potencialmente sobre a inflação brasileira. Pressionaram o dólar contra o real e tornaria o aumento de preços registrado nos últimos meses em um duradouro processo inflacionário no Brasil.

Dependemos, em grande medida, do comportamento das commodities no mercado internacional, dos bancos centrais estrangeiros e da nossa capacidade de gerar menos ruído político.

Veremos.

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