O volume de dinheiro na economia não para de crescer, e agora?

André Galhardo - De Olho no Câmbio

Visão Geral

Desde o início da pandemia o Banco Central do Brasil tem agido no intuito de diminuir os impactos da propagação do novo coronavírus sobre a economia brasileira.

Foram anunciadas diversas medidas de estímulo fiscal, entre as quais se destacam as sensíveis diminuições da taxa básica de juros e dos percentuais de depósitos compulsórios, por exemplo.

Na última quarta-feira, o Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu reduzir, mais uma vez, a taxa básica de juros, nesta oportunidade, em 0,25%.

Com a Selic em 2% ao ano quais os reais impactos da política monetária sobre a economia e a vida das pessoas? Ao olharmos para os juros estamos fazendo a leitura correta? Esses instrumentos utilizados pelo Banco Central podem nos levar direto para algum aumento da inflação?

Acompanhe nossa análise a seguir.

Base monetária

A base monetária é um agregado que soma todos os recursos em espécie que estão sob a posse das pessoas e das empresas, ou seja, o dinheiro que você tem no bolso, na carteira, no console do carro, no cofre, enfim, todos os seus recursos em espécie.

Além dos recursos em espécie, a base monetária também é composta por todos os recursos em posse dos bancos. E aqui é importante dividir esses recursos em três: reservas compulsórias, parte dos recursos depositados nos bancos comerciais devem obrigatoriamente ficar depositada junto ao Banco Central; reservas voluntárias, que compreendem o dinheiro que os bancos enviam voluntariamente ao Banco Central para cobrir, por exemplo, divergências entre valores de cheques no dia e, por fim as reservas técnicas, que compreendem simplesmente o caixa dos bancos.

Pois bem, a soma do dinheiro impresso na mão das pessoas e as reservas bancárias em papel moeda emitido é chamada de base monetária.

Papel moeda em poder do público

Nos últimos dias, tem chamado a atenção dos analistas o volume crescente de dinheiro impresso em poder da população.

No último dia do mês de junho deste ano, o volume de recursos deste tipo alcançou aproximadamente R$ 271 bilhões. No início de janeiro este montante era de aproximadamente R$ 228 bilhões, trata-se de um incremento de 18,8% em apenas seis meses.

Na mesma base de comparação, no ano passado a variação percentual foi negativa em mais de 9%, o que indica, de fato, um movimento atípico neste primeiro semestre.

Reservas bancárias

O volume de recursos sob a forma de reservas bancárias também tem aumentado, e numa fotografia entre os dias 2 de janeiro de 30 de junho, o incremento foi de aproximadamente 14%.

As informações disponibilizadas pelo Banco Central são diárias e sofrem mudanças bruscas. Apenas para tentar transmitir essa volatilidade do indicador, vamos pegar alguns números. No dia 30 de junho o volume total de reservas bancárias era de aproximadamente R$ 46,6 bilhões, quatro dias antes esse montante estava pouco acima de R$ 67 bilhões.

Portanto, se este texto tivesse sido escrito alguns dias antes a variação percentual poderia ser menor que 14% ou até negativa, mas é fato de que nas últimas semanas o volume deste tipo de recurso aumentou significativamente.

A decisão do Copom

No bojo da pandemia o Copom decidiu cortar a taxa básica de juros mais uma vez. Trata-se da décima redução consecutiva da Selic.

O movimento do Banco Central não foi surpreendente, ademais, na ata da última reunião o Banco havia sinalizado a possibilidade de realizar mais um corte residual e a decisão estaria condicionada ao desempenho econômico brasileiro até a próxima reunião, que aconteceria dali a quarenta e cinco dias.

Na verdade, apesar de bastante discreto, o comunicado publicado após a decisão de política monetária da última quarta-feira (05/08), deixou a porta aberta para novos ajustes, ou seja, existe a possibilidade de mais um corte na taxa de juros na próxima reunião de 15 e 16 de setembro.

A decisão de diminuir a Selic em mais uma oportunidade vem do aumento do balanço de risco no exterior, movimento que tem condicionado políticas monetárias frouxas por um período muito mais distendido nas economias centrais. 

As taxas de juros próximas de zero nos Estados Unidos, em 0% na Zona do Euro e negativa no Japão, permitiram a autoridade monetária brasileira trabalhar com uma taxa básica estimulativa.

Além do comportamento dos demais bancos centrais, a anêmica atividade econômica brasileira também permite a prescrição de uma política monetária expansionista sem que haja riscos para o cumprimento da meta de inflação.

Existe risco de inflação?

Nós temos acompanhado o crescimento do volume de dinheiro nas mãos das pessoas e empresas, além disso também é crescente o volume de recursos sob a forma de reservas bancárias.

O Banco Central tem agido no intuito de estimular a atividade econômica, colocando a taxa básica em patamares que nem o mais otimista dos economistas poderia prever.

E, de repente, uma nova cédula de R$ 200,00 traz uma (infundada) desconfiança sobre o aumento da inflação.

De modo geral e bem resumido, os volumes de recursos em poder do público e nos bancos comerciais é reflexo do pagamento do auxílio emergencial pago pelo governo nas últimas semanas, portanto, não tem ligação com índice de preços.

A despeito do aumento do dinheiro em circulação, existe uma relevante capacidade ociosa nos mais variados setores da economia brasileira.

Ainda que dinheiro em mais abundância possa trazer algum movimento de alta na demanda agregada, estes poderão ser atendidos de forma muito tranquila, sem que haja qualquer risco de pressão sobre os preços nos meios de produção.

E o impacto sobre o câmbio, afinal?

A recente queda na taxa básica de juros não deve ter impacto significativo sobre o câmbio real x dólar.

Isso acontece porque a maior parte dos bancos centrais têm trabalhado em consonância com o banco central americano (FED) e o Banco Central Europeu (BCE) e ambos têm apostado em uma retomada muito lenta e penosa da atividade econômica global.

Neste sentido, a cotação do dólar sofrerá poucos impactos vindos da política monetária brasileira e das consequências da política fiscal sobre a base monetária.

Os maiores reflexos virão dos desdobramentos políticos internos (isso envolve a agenda de reformas) e do desempenho da economia nacional.

No exterior as atenções estarão cada vez mais voltadas para pacotes de estímulo fiscais e monetários, sobretudo nas economia avançadas e, claro, nas eleições americanas.

Veremos.

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