É a hora da desaceleração econômica global?

Uma nova desaceleração econômica global se aproxima e os bancos centrais dos países desenvolvidos se veem obrigados a praticar uma política monetária ainda mais frouxa. De modo geral isso significa que as taxas de juros ao redor do mundo serão reduzidas e, caso isso não seja possível – na Europa a taxa nominal de juros já é de 0% – estímulos de diversas ordens devem surgir.

Qual o impacto disso para o Brasil?

Fomc mantém juros, mas abre portas para corte

Na última quarta-feira, dia 19, o Banco Central dos Estados Unidos decidiu manter a taxa básica de juros no patamar atual de 2,5% ao ano. Até aqui, sem surpresa. O maioria dos analistas de mercado esperava mesma que o Federal Reserve procedesse com manutenção da taxa.

O que chamou a atenção no entanto foi o apontamento do Fomc (Federal Open Market Committe, responsável pelas taxas de juros norte americanas) sobre a situação da economia dos Estados Unidos. Segundo nota do próprio banco a atividade econômica do país passou a ser vista como moderada, uma diminuição relevante em relação ao último comunicado, onde se apontava uma atividade econômica interna sólida.

Os dados sobre a economia dos Estados Unidos ainda são ambíguos, enquanto o desemprego permanece em níveis muito baixos e o consumo das famílias vem se mostrando cada vez mais forte, índices de atividade industrial, levantados pelo próprio FED, e dados antecedentes como o PMI (índice de atividade industrial) tem mostrado alguma desaceleração econômica no país.

BCE vê desaceleração econômica

A desaceleração da União Europeia, sobretudo dos principais países do bloco como Alemanha, França e Itália, tem trazido dúvidas sobre o posicionamento do Banco Central Europeu (BCE) diante do temor de uma nova crise global.

Mario Draghi, presidente do BCE, estaria de mãos atadas, uma vez que a taxa de juro está em 0% há muito anos. Mas tanto o Banco Europeu como o Banco do Japão – onde a taxa de juros está negativa em 0,1% – e da Inglaterra BoE decidiram emitir sinais de mais afrouxamento monetário.

O Banco da Inglaterra decidiu, nesta semana, manter a taxa básica de juros inalterada em 0,75% e emitiu alertas sobre a possibilidade de desaceleração da economia nos próximos meses, resultado das tensões comerciais e do próprio imbróglio político que se encontra o Reino Unido.

No Japão, o presidente do BOJ, Haruhiko Kuroda, garantiu que a taxa de juros do Japão permanecerá inalterada pelo menos até meados do ano que vem.

A fala de Kuroda deixa claro que o Japão, tal como as demais economias avançadas está disposto a manter ou intensificar a política monetária expansionista, e isso é um péssimo sinal de que uma crise forte pode, de fato, chegar em breve.

Diante dessa possibilidade crise crise ou de forte desaceleração da economia global, Draghi já anunciou que pode reforçar as políticas de estímulo monetário do Zona do Euro como, por exemplo, prorrogar o prazo para o aumento da taxa básica de juros; um novo corte na taxa vigente e até a retomada das compras de bônus por parte do BCE.

A fala de Draghi o colocou em rota de colisão com Tump, que reagiu horas depois dizendo que novos estímulos monetários na Zona do Euro deixariam as coisas mais fáceis para a Europa na competição com os Estados Unidos.

O fato é que essa disputa pode cristalizar, de uma vez por todas, a pressão de Trump pela redução da taxa básica de juros nos Estados Unidos, em outras palavras, a fala de Draghi é mais um elemento, explosivo, que engrossa o coro de Trump por uma política monetária menos hostil em ao seu mandato.

Selic, alta até quando?

O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu manter inalterada a taxa básica de juros do Brasil em 6,5% ao ano pela décima vez consecutiva. Apesar de decisão não ter surpreendido o mercado, havia aqueles que já apostava em uma redução da taxa já na decisão das reuniões de junho.

Essa aposta se deu por motivos bastante simples: primeiramente o PIB trimestral do Brasil recuou pela primeira vez desde o primeiro trimestre de 2016; o monitor do PIB da Fundação Getulio Vargas (FGV) apontou nova queda do PIB no mês de abril; e o IBC Br, indicador de atividade econômica do Banco Central também apontou recuo da atividade econômica do Brasil no quarto mês do ano.

Além dos indicadores apontados acima, algumas proxies mostram que o mês de maio e junho também podem apresentar declínio ou estabilidade, o que poderia levar a uma nova queda do PIB no segundo trimestre de 2019, e levaria o Brasil a uma recessão técnica.

Como na economia não existem milagres, nosso entendimento é de que o Banco Central do Brasil apenas adiou em 45 dias a decisão de cortar a taxa básica de juros, ao menos para 6,25% ao ano.

Até a próxima reunião do Copom haverá mais clareza sobre a real economia trazida pela reforma da previdência, sobre a governabilidade do presidente Jair Bolsonaro, e no cenário internacional veremos avançar a situação do Brexit e da guerra comercial, todas elas apontando para um afrouxamento da política monetária por aqui também.

Tendências e perspectivas

Abriu-se uma porta para a redução da taxa básica de juros nos Estados Unidos. O FED, por meio do FOMC disse que olhará com cautela a inflação doméstica, os dados de modo geral e os desdobramentos globais.

Tendo isso em mente sabemos que:

i) A inflação deve permanecer moderada, sobretudo a inflação que considera o preço dos alimentos e combustíveis, as safras dos países produtores de alimentos estão em ordem e o petróleo reverteu o movimento de alta que foi visto nos últimos meses.

ii) Os desdobramentos globais não devem ser positivos, a saber pela desaceleração da economia da Zona do Euro e pela intensificação da guerra comercial com a China, o que deve alimentar ainda mais a desaceleração da economia global encabeçada pela Alemanha e pela China.

iii) A inflação sob controle e a possível crise que se avizinha farão com que as taxas de juros caiam no curto e médio prazo, dando força para as moedas dos países periféricos como o Brasil. De modo geral, os desdobramentos políticos e econômicos internacionais jogam a favor do Real.

iv) Jogam a favor da desvalorização do Real, apenas, a situação política interna.

Tendência à valorização do Real no curto prazo.

Seguimos de olho.

André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.

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