Tempos difíceis à frente

As incertezas no Reino Unido, a situação política complicada nos EUA e os resultados econômicos ruins em diversos países da Europa podem causar dificuldades cambiais para o investidor brasileiro. A tendência de valorização do Real deve ser revertida e a perspectiva de recessão ganha mais força.

Ainda não dá para saber a dimensão do que nos aguarda nos próximos meses, mas esta semana trouxe um conjunto de preocupações consigo. Alemanha registrou novos resultados ruins, e dados antecedentes dos EUA apontam para algum arrefecimento da atividade econômica, Reino Unido permanece envolto em incertezas. E as moedas reagindo a esses movimentos.

Acompanhe.

Real x Dólar

Expectativas de queda dos juros nos EUA

O Dólar comercial começou a semana cotado a R$ 4,1618 e fechou o pregão de segunda-feira (30) cotado a R$ 4,1556. Trata-se de uma apreciação do Real em torno de 0,15%.

Desde segunda que o Real tem valorizado fortemente e os mercados passaram por um processo de queda intensa. O Ibovespa, por exemplo, começou a semana na casa dos 105 mil pontos e abriu o pregão de sexta (4/10) na casa dos 101 mil pontos.

A explicação por trás do movimento varia. Mas há um consenso: há um processo de deterioração em curso. Boa parte da apreciação do Real pode ser explicada pelas expectativas de queda dos juros nos EUA que, por sua vez, são reflexo da perspectiva de desaceleração da maior economia do mundo. 

Mas há um pequeno problema com essa explicação: o privilégio exorbitante. Já tratei neste espaço em outras oportunidades sobre o seu significado. O privilégio exorbitante decorre do simples fato de o Dólar ser a moeda de reserva global, desse modo, por mais que seu emissor esteja com problemas econômicos, os investidores continuarão recorrendo ao Dólar.

De todo modo, não podemos esquecer que os EUA se encontram em uma situação muito particular de sua história, tanto em termos econômicos quanto políticos. Politicamente, há em curso um inquérito contra o presidente Donald Trump para avaliar se ele cometeu crime de responsabilidade no caso das ligações para a Ucrânia. Nunca um presidente estadunidense foi derrubado até hoje, não por meio de um impeachment.

A situação toda depreciou bastante o Dólar durante esta semana e, por conseguinte, fortaleceu o Real. Por conta disso, é possível que as expectativas em torno da agenda de reformas tenha trazido um novo gás ao mercado, uma vez que o Ministro da Economia, Paulo Guedes, segue em sua cruzada e já prepara novas pautas para o Congresso.

Nesse contexto, incertezas e preocupações se ampliam de forma bastante clara – especialmente por um processo mais amplo de deterioração política em curso na América Latina também. Assim a moeda americana saiu de R$ 4,1618 na segunda-feira e abriu o pregão de sexta-feira (4) negociada na casa dos R$ 4,0816. O Real acumula, portanto, uma apreciação de aproximadamente 1,93%.

Real x Euro

Euro ganhou 0,32% do seu valor na semana entre segunda e sexta

No lado do Euro, esta semana foi pautada pelos resultados dos Índices de Gerentes de Compras (Purchasing Managers’ Index – PMI).  A moeda Europeia abriu a semana cotada a R$ 4,5516, mas também perdeu para o Real até sexta-feira.

O movimento, diferentemente da semana passada, deu-se claramente por uma avaliação muito mais preocupante por parte dos investidores institucionais sobre a situação da Zona do Euro e seus membros. 

O PMI da Indústria alemã, por exemplo, como  esperado, registrou novo mês de queda. Isso significa que, sob a perspectiva dos gerentes de compras das indústrias, a atividade industrial segue fraca e as empresas não têm expectativas de ampliar os negócios nos próximos meses. E já conhecemos a receita: sem negócios na maior economia da região, uma recessão capitaneada por Alemanha se torna cada vez mais próxima.

Assim sendo, na abertura do pregão desta sexta-feira, o Euro foi cotado a R$ 4,4825, uma apreciação semanal do Real de aproximadamente 1,52% em relação à moeda europeia. Em relação ao Dólar americano, o Euro ganhou 0,32% do seu valor na semana entre segunda e sexta. 

Real x Libra Esterlina

Libra Esterlina oscila bastante esta semana

Por fim, a Libra Esterlina oscilou bastante esta semana. Em relação ao Real, a Libra abriu a semana cotada a R$ 5,1132. A moeda britânica chegou a cair e se recuperar até a quarta-feira (2/10), quando foi negociada a R$ 5,1163, mas rapidamente voltou a perder força. 

O movimento da Libra foi capitaneado pelas investidas do primeiro-ministro Boris Johnson em sua tentativa de não estender o prazo para o Brexit. Segundo jornais ingleses, o primeiro ministro está pedindo à União Européia que descarte uma nova extensão do Artigo 50 como parte de um novo acordo sobre o Brexit.

Norte irlandeses receiam, contudo, um Brexit sem acordo. A possibilidade de uma nova fronteira com a Irlanda desperta lembranças e temores de um regresso da violência de tempos passados.

De todo modo, o plano de Johnson para a Irlanda do Norte pode não levar a um acordo sobre o Brexit, mas representa uma iniciativa significativa para romper o impasse uma vez que a proposta prevê que a Grã-Bretanha pode assinar acordos comerciais com países como os EUA após o Brexit, mas os produtos não podem entrar na UE via Irlanda do Norte.

Mas na tentativa de angariar apoio ao seu projeto, Johnson fará viagens às capitais da UE para vender seu plano de Brexit, mas sugere que grandes concessões são improváveis. Em suma, parece que o primeiro-ministro não busca diálogo, mas aceitação a sua proposta. 

Nesse contexto, após uma semana bastante puxada para a Libra Esterlina, a moeda se manteve em uma trajetória de depreciação, sendo negociada no patamar de R$ 5,0409 na abertura do pregão de sexta-feira (4). Na semana, a apreciação do Real em relação à moeda britânica é de quase 1,98%.

Perspectivas

Tendo em vista todas as dificuldades que estão à nossa frente, a perspectiva de recessão ganha mais força e a tendência de valorização do Real visto nesta semana deve ser revertida.

O ponto que se destaca é a crescente incerteza, refletida, por exemplo, em movimentos pouco comuns – como a depreciação do Dólar em um contexto de expectativa de recessão. 

Nesse sentido, acreditamos que a valorização do Real é algo pontual. Conforme o mercado ganha clareza do que está se desenhando, a aversão ao risco se fará presente e o Dólar deve ficar mais caro.

Seguimos de olho.

André Galhardo é economista-chefe da Análise Econômica Consultoria, professor e coordenador universitário nos cursos de Ciências Econômicas. Mestre em Economia Política pela PUC-SP, possui ampla experiência em análise de conjuntura econômica nacional e internacional, com passagens pelo setor público.



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