A retomada econômica brasileira e a dupla preocupação

Visão Geral

Alguns indicadores econômicos começaram a mostrar que a economia nacional está, aos poucos, retomando o nível de atividade.

Apesar do elevado volume de pessoas em situação de desemprego, os dados têm captado uma relativa melhora da situação econômica, sobretudo em função do impacto da segunda onda de Covid-19 ter sido, em alguma medida, menor que o esperado.

Algumas instituições de grande porte tem projetado um crescimento robusto para 2021, revertendo total ou parcialmente a queda registrada no ano passado.

Apesar das “boas notícias”, uma retomada do setor de serviços associada ao aumento do clima de incerteza política no país, podem engrossar o ritmo de aumento de preços por aqui. Esse movimento poderia obrigar o Banco Central a jogar contra a economia brasileira.

Acompanhe nossa análise a seguir.

Dados da economia doméstica

Antes de falar dos números da nossa economia, é importante recordar que nós iniciamos o ano de 2021 sem o auxílio emergencial. Em função disso, os dados do primeiro trimestre, quando comparados com o último trimestre do ano, apresentam forte retração.

No entanto, o que tem permitido algumas análises mais otimistas acerca da retomada econômica do Brasil, é o comportamento da economia diante do agravamento da pandemia no país, sobretudo a partir de março.

Em março deste ano, apesar de termos atingido volumes alarmantes de mortes e infecções, segundo o IBGE houve queda de “apenas” 4% no setor de serviços em relação ao mês de fevereiro.

Apesar de representativa, a queda de 4% não se parece em nada com a queda registrada em abril do ano passado, primeiro mês completo com restrições em função do aumento de casos de Covid-19 no Brasil. Naquela oportunidade, houve recuo mensal de 11,9%. Esse recuo foi precedido de outro importante recuo mensal registrado no mês de março, -6,6%.

Na comparação com o primeiro trimestre de 2020, o setor de serviços apresentou recuo de -0,8% e o comércio varejista de -0,6%. Já a indústria brasileira, que apresenta claros sinais de desaceleração ao longo dos últimos meses, apresentou avanço de 4,4% na comparação do primeiro trimestre deste ano com o primeiro trimestre do ano anterior.

Dito de outra forma, a estatística tem ajudado grandemente a tornar as análises mais otimistas. Falaremos disso adiante.

Dados do setor externo

Diferentemente do que tem acontecido com indicadores da economia doméstica, os indicadores que envolvem o relacionamento comercial e financeiro do Brasil com os demais países, têm se mostrado bastante positivos.

O aumento dos preços das commodities somado à desvalorização da moeda brasileira, tem permitido que o Brasil construa importantes resultados comerciais nos últimos meses.

De janeiro a abril deste ano o país acumula um superávit comercial de cerca de US$ 18,2 bilhões, segundo maior resultado para os quatro primeiros meses do ano de toda a série histórica, atrás apenas do primeiro quadrimestre de 2017. O número do primeiro quadrimestre de 2021 é 104% maior que o registrado nos quatro primeiros meses de 2020.

Até a terceira semana do mês de maio, o Ministério da Economia já havia registrado superávit comercial de aproximadamente US$ 7 bilhões. O número de maio deve ajudar a construir o maior resultado comercial positivo registrado nos cinco primeiros meses do ano, em toda a série histórica.

Os indicadores de investimento produtivo no país, que haviam minguado em 2020, se apresentaram melhores em fevereiro e março. Já os investimentos em ativos financeiros também têm, com a ajuda da estatística, resultados muito melhores no primeiro trimestre de 2021 em comparação a igual período do ano passado.

A primeira preocupação

Até aqui, parece que está tudo bem, certo? Mais ou menos. Na verdade, mais para menos do que para mais.

A primeira preocupação advém do excesso de otimismo de alguns economistas e instituições. Por termos registrado uma queda de 4,1% no ano passado, parte dos agentes enxerga uma grande possibilidade de crescimento robusto para esse ano, recompondo as perdas de 2020.

Uma retomada mais robusta é sim possível e factível para este ano, mas existem diversos problemas que podem impedir esse ímpeto econômico nacional, e o primeiro deles está relacionado justamente à questão cambial.

Apesar dos recentes episódios de valorização do real, a taxa de câmbio tem se mostrado bastante resiliente em permanecer em patamares ainda elevados se comparado com o nível pré-pandemia.

Se por um lado a taxa de câmbio mais elevada (real desvalorizado) nos permite construir importantes resultados comerciais e atrair investimentos para o país, por outro, ela tende a impactar na inflação doméstica, que está no maior nível desde 2016, acima do limite superior da meta de inflação.

Se o aumento da inflação se mostrar mais prolongado do que se espera atualmente, o Banco Central acabará atuando para tentar ancorar as expectativas, via aumento de juros, o que pode, em alguma medida, retardar o processo de retomada da economia.

A segunda preocupação

Uma segunda preocupação advém das questões estruturais da nossa economia, como o nível de desemprego e a quase inação do Estado no que diz respeito aos investimentos em infraestrutura.

Não que isso não nos permita construir um crescimento interessante este ano, mas as condições que já estavam impostas antes da pandemia vão voltar para a ordem do dia e isso nos trará de volta à condição pré-crise. Em outras palavras, a condição de crescer pouco, mesmo com taxa de juros relativamente baixa e uma taxa de câmbio menos volátil.

Ou seja, ainda que o Brasil cresça acima de 3% este ano, esse parece ser o único fôlego que dispomos neste momento. A taxa de desemprego deve permanecer muito elevada nos próximos anos, a capacidade de investimento do Estado está comprometida pelo teto de gastos e o empresário teme em não concretizar suas vendas diante da anemia econômica vista no país desde 2014.

Além disso, as eleições estão logo aí e há um amplo desgaste do ambiente político nacional em curso. Ambos devem contribuir em grande medida para eventuais desvalorizações da moeda brasileira.

Veremos.

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